“Quero ser jornalista no futuro. No meu país, os políticos enganam as pessoas. Eu quero mudar isso”.
Rojina tem 18 anos e parece ser uma menina determinada. Apesar de ser de poucas palavras - seja por timidez ou dificuldade em expressar-se - é a típica adolescente. A título de exemplo, tive de pedir-lhe três vezes que me enviasse fotografias normais, naturais, sem os filtros usados nas redes sociais.
Nasceu a 16 de setembro de 2003 numa aldeia no norte do Bangladesh. Tem três irmãos mais velhos e confessa que, para ela, “é triste” não ter uma irmã. Quando nasceu, “a vida era muito difícil”. A mãe trabalhava numa fábrica de tecidos, o pai era motorista e os irmãos “eram pequenos”. Tal como tantas outras famílias, a de Rojina também se mudou para a capital Daca à procura de melhores condições de vida.
- A aldeia não era boa para mim., justifica.
- Como assim?, pergunto.
- Tínhamos problemas familiares com os meus avós.
- Que tipo de problemas?
- Eles não gostavam do meu pai. Não sei porquê.
Tento indagar se existia um motivo plausível para os avós não gostarem do pai.
- O meu pai era o melhor para mim., afirma.
- Era?, pergunto.
- Sim. Morreu há cinco anos.
- De que morreu o teu pai?
- Tinha problemas nos dois rins.
- E como era o teu pai?
- O meu pai era uma boa pessoa.
- Tratava-te bem? Aceitava-te mesmo sendo uma rapariga?
- Para ele, não era difícil eu ser uma rapariga…
- Pergunto porque, como sabes, em algumas famílias, no Bangladesh, as meninas são consideradas um fardo…
- O meu pai amava-me., afirma, emocionada.
Começou a frequentar uma escola pública com sete ou oito anos e a primeira vez que ouviu falar no Dhaka Project, a escola da Fundação Maria Cristina (MCF), foi através da professora. Recorda que o primeiro contacto com a fundadora Maria Conceição foi “muito bom”, embora confesse que não sabe como explicar com mais palavras.
- Eu não entendia o que ela dizia. Deu-nos chocolates e prendas. Foi muito bom!
Procuro apelar à memória visual para obter mais detalhes desses tempos e consigo arrancar-lhe mais duas ou três palavras.
- A escola era muito grande. Os professores eram bons e amigáveis e as outras crianças também.
Quando a escola da MCF fechou por divergências com a equipa de gestão local e em resultado da crise financeira internacional, Rojina, tal como muitos outros alunos, teve de encontrar uma alternativa.
- Quando a escola da MCF fechou fui para uma escola pública. Mas, quando a Maria voltou, fomos para uma escola privada.
- E como era essa escola?
- Era boa, uma escola grande, os professores muito amigáveis e ajudavam quando eu não entendia.
Talvez a forma de Rojina contar a sua vida tenha os mesmos filtros das fotografias. Por isso, pergunto-lhe como era a vida com a família, nessa altura, a casa onde viviam, achando que também ela, tal como a maioria dos alunos da MCF, vivia nos famosos “slums”, os bairros de lata de Daca.
- Nós não vivíamos nos slums. Vivíamos numa casa.
- E como era essa casa?
- Era pequena, mas era boa.
- Pequena… só com um quarto? Partilhavam cozinha e casa-de-banho com outras famílias
- Não. Tinha cozinha e casa-de-banho, água e eletricidade.
A família aumentou desde que os três irmãos casaram. Dois trabalham em fábricas de têxteis, um trabalha “com Internet”. Vivem com as respetivas mulheres na mesma casa, “ajudam a pagar as contas” e, segundo Rojina, dão-se todos bem.
Actualmente, está no 12º ano e, quando terminar a escola, quer fazer um estágio, entrar na Universidade e, idealmente, ficar a viver no Dubai.
- Mas porquê o Dubai?, pergunto.
- Gosto do Dubai, não sei explicar porquê. As pessoas são muito boas, amigáveis.
- E não gostarias de voltar ao Bangladesh?
- Sim, mas só para visitar a família.
- Porque é que não queres viver no Bangladesh?
- Há pessoas no Bangladesh mais batoteiras, mais desonestas.
- Que pessoas?
- No meu país, os políticos enganam as pessoas.
- É por isso que queres ser jornalista?
- Sim. Quero acabar com isso.
- E como pretendes fazê-lo?
- Primeiro, quero reunir a informação e perceber se estão a fazer bem ou mal. Se estiverem a fazer coisas erradas, quero fazer justiça, quero castigá-los.
E todos esperamos que consigas, Rojina.
Esta história é verídica e relata a vida de Rojina contada na primeira pessoa, durante uma entrevista realizada por videochamada no dia 13 de abril de 2021. Foi escrita no âmbito de um trabalho realizado para a Fundação Maria Cristina.
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